quarta-feira, 30 de setembro de 2015

ÁGUIA OU GALINHA: O QUE SOMOS?
Artigo publicado (29/09) no Jornal Diário de Caratinga.

As metáforas, analogias, contos, parábolas… são formas muito interessantes de tentar de alguma forma expressar o conhecimento, de provocar a reflexão. Um dos livros mais conhecidos da humanidade, a Bíblia, é recheada destas formas de linguagem.
Logo a seguir leremos um mito que foi contado, por um líder político, durante a luta pelo processo de libertação do seu país. A partir da vida de dois animais, foi elaborada uma metáfora sobre a condição da vida humana. De como agimos, pensamos e vivenciamos a vida. O mito é o seguinte:
“Era uma vez um camponês que foi à floresta vizinha apanhar um pássaro para mantê-lo cativo em sua casa. Conseguiu pegar um filhote de águia. Colocou-o no galinheiro junto com as galinhas. Comia milho e ração própria para galinhas. Embora a águia fosse o rei/rainha de todos os pássaros.
Depois de cinco anos, este homem recebeu em sua casa a visita de um naturalista. Enquanto passeavam pelo jardim, disse o naturalista:
– Esse pássaro aí não é galinha. É uma águia.
– De fato – respondeu o camponês. É águia. Mas eu a criei como galinha. Ela não é mais uma águia. Transformou-se em galinha como as outras, apesar de asas de quase três metros de extensão.
– Não – retrucou o naturalista. Ela é e será sempre uma águia. Pois tem um coração de águia. Este coração a fará um dia voar às alturas.
– Não, não – insistiu o camponês. Ela virou galinha e jamais voará como águia.
Então decidiram fazer uma prova. O naturalista tomou a águia, ergueu-a bem alto e desafiando-a disse:
– Já que você de fato é uma águia, já que você pertence ao céu e não à terra, então abra suas asas e voe!
A águia pousou sobre o braço estendido do naturalista. Olhava distraidamente ao redor. Viu as galinhas lá embaixo, ciscando grãos. E pulou para junto delas.
O camponês comentou:
– Eu lhe disse, ela virou uma simples galinha!
– Não – tornou a insistir o naturalista. Ela é uma águia. E uma águia será sempre uma águia. Vamos experimentar novamente amanhã.
– No dia seguinte, o naturalista subiu com a águia no teto da casa. Sussurrou-lhe:
– Águia, já que você é uma águia, abra suas asas e voe!
Mas quando a águia viu lá embaixo as galinhas, ciscando o chão, pulou e foi para junto delas.
O camponês sorriu e voltou à carga:
– Eu lhe havia dito, ela virou galinha!
– Não – respondeu firmemente o naturalista. Ela é águia, possuirá sempre um coração de águia. Vamos experimentar ainda uma última vez. Amanhã a farei voar.
No dia seguinte, o naturalista e o camponês levantaram bem cedo. Pegaram a águia, levaram-na para fora da cidade, longe das casas dos homens, no alto de uma montanha. O sol nascente dourava os picos das montanhas.
O naturalista ergueu a águia para o alto e ordenou-lhe:
– Águia, já que você é uma águia, já que você pertence ao céu e não à terra. Abra suas asas e voe!
A águia olhou ao redor. Tremia como se experimentasse nova vida. Mas não voou. Então o naturalista segurou-a firmemente, bem na direção do sol, para que seus olhos pudessem encher-se da claridade solar e da vastidão do horizonte.
Nesse momento, ela abriu suas potentes asas, grasnou com o típico Kau-kau das águias e ergueu-se, soberana, sobre si mesma. E começou a voar, a voar para o alto, a voar cada vez mais alto. Voou… voou… até confundir-se com o azul do firmamento…”
Estamos vivendo coletivamente um momento delicado, podemos nos perguntar a todo instante: somos águias ou galinhas? Vivemos como águias ou como galinhas? Devemos olhar-nos a todo o momento e discernir as razões existentes que tentam nos manter como galinhas, e ao mesmo tempo acreditar que é possível despertar a águia que existe em cada um de nós! Feito isto será um importante passo que daremos para a construção da sociedade que sonhamos.
Walber Gonçalves de Souza é professor.

sexta-feira, 25 de setembro de 2015

Trabalho de campo em Ouro Preto

Com base nos seus conhecimentos, estudos e pesquisas 
elabore um texto respondendo a seguinte questão: 
Qual a importância cultural, econômica, social... de Ouro Preto para o Brasil? 
Seu texto deverá ter no mínimo 5 linhas digitadas. Bom trabalho!!

quinta-feira, 24 de setembro de 2015

POR QUE O CONHECIMENTO TRANSFORMA A VIDA?
Artigo publicado no dia 22/09 no Jornal Diário de Caratinga.

O século XXI para muitos é considerado o século do conhecimento. Nunca na história deste país, acredito que todos já tenham ouvido esta frase, o conhecimento esteve tão acessível. Basta querer conhecer!
Não afirmo isto pensando somente nas possibilidades que a internet nos proporciona; as quais são infinitas, pois sabemos que ela é nos dias atuais um dos meios mais usados pelas pessoas como fonte de conhecimento. Mas refiro-me também à popularização de uma série de outros meios, como os diversos canais de televisão, disponíveis para os mais variados gostos, as bancas de jornal repletas de intermináveis tipos de revistas, e outra coisa que boa parte das pessoas apostaria que iria acabar, mas por incrível que possa parecer, a cada ano está crescendo mais, a publicação de vários livros, que atende também a todos os públicos com gêneros literários de indizíveis estilos e tudo isto com uma característica em comum, a variação de preço que se torna acessível à todos os interessados pelos saberes.
Agora, uma pergunta poderia surgir em meio a esta realidade: por que, na sociedade que vive na era da informação, sentimos uma sensação de estarmos vivendo em uma selva, como diria o filósofo Hobbes, o homem sendo o lobo do próprio homem? Um paradoxo estranho, esquisito e difícil de entender.
Assim percebemos que só conhecer não é o suficiente. Às vezes digo para os meus alunos, o conhecimento deve servir para sermos um profissional melhor, deve servir para vivermos bem, deve servir para termos uma vida financeira saudável, deve servir para adquirimos saberes, deve servir para ampliar nossa cultura, deve servir para tantas coisas… mas elas só terão realmente valor e importância, se o conhecimento, antes de qualquer coisa seja útil para que cada um de nós se torne um ser humano melhor. E é justamente aí que está a espinha dorsal de todas as outras conquistas. Caso contrário poderemos ter tudo, mas nunca seremos nada.
Verificamos neste contexto o desafio do terceiro milênio, continuar ampliando e fornecendo informações, conhecimentos, mas ao mesmo tempo, proporcionar o desenvolvimento da maturidade, dos valores essencialmente humanos que serão as colunas de sustentação dos saberes, do conhecimento.
Os mestres do pensamento, os grandes filósofos da humanidade já alertavam para esta situação há séculos. Sócrates, Platão, Aristóteles, São Tomás de Aquino, Santo Agostinho… ancoraram todas as suas ideias não somente na construção do conhecimento, mas na forma como ele é empregado, valorizado e vivenciado pelas pessoas.
Eles alertavam também sobre o perigo do conhecimento quando ele é manipulado para atender a interesses escusos de pequenos grupos, levando o indivíduo ao processo de alienação ou defesa cega de ideologias. Identificaram estas pessoas como sofistas, pois usavam do conhecimento, da palavra, para enganar, ludibriar as pessoas.
O conhecimento transforma a vida quando acreditamos e temos consciência dele. Se sei alguma coisa sobre algum assunto, mas não acredito no que sei, não vejo sentido naquilo, portanto o conhecimento adquirido estará simplesmente ocupando uma parte do nosso cérebro e nada mais. Por isso sabemos de tantas coisas e no dia a dia observamos poucas e lentas mudanças. Para ilustrar, cito exemplos banais do nosso cotidiano, sabemos a hora da coleta de lixo, mas continuamos mantendo o hábito de colocar o nosso lixo na calçada a qualquer momento; sabemos que conversas paralelas em sala de aula ou ambiente de conferência atrapalham, mas insistimos nos cochichos com o colega mais perto; sabemos que o mosquito da dengue prolifera em ambientes com água parada, mas deixamos nosso quintal sujo, a calha sem manutenção; sabemos que açúcar e sal em excesso é super danoso à saúde, mas mantemos hábitos alimentares carregados destes ingredientes; sabemos que é preciso fazer exercícios físicos, mas preferimos uma vida mais sedentária… imagine quantos exemplos poderiam ser descritos aqui.
O conhecimento é o caminho que trilhamos para melhorar a nossa vida. Mas acredite no conhecimento que é adquirido, senão o risco de se tornar inócuo será muito provável e assim nenhum esforço valerá a pena, nada adiantará. Lembrando Fernando Pessoa, “tudo vale a pena se a alma não é pequena”; isto é, de nada adianta se o conhecimento é grande se a alma não se transforma através dele.
Walber Gonçalves de Souza é professor.

terça-feira, 15 de setembro de 2015

HÁ ESPERANÇA... É PRECISO ACREDITAR!
Artigo publicado hoje (15/09) no Jornal Diario de Caratinga.

O dia parecia como outro qualquer, mas ele não seria. Naquele dia um homem mandou trancar as portas da fábrica e atear fogo em tudo. Lá dentro uma considerável quantidade de mulheres que estavam lutando por uma série de direitos que elas achavam ser indispensáveis para uma vida mais digna, portanto com menos exploração. O fim foi trágico, mas as consequências não, pois marcou o início da luta feminina pela conquista dos seus direitos.
A África do Sul viveu até meados do último século do milênio passado uma parte triste da sua história, conviveu com o Apartheid, a conhecida e declarada separação entre negros e brancos. Mas um homem, Nelson Mandela, acreditou que as coisas poderiam ser diferentes. Acreditou ao ponto de ficar preso por quase três décadas, mas não perdeu os seus ideais. Colaborou decisivamente para o fim desta divisão desumana. Ao morrer deixou o seu país convivendo com outra realidade.
A Floresta Amazônica estava convivendo com um processo de desmatamento assustador, e com ele a vida de milhares de seringueiros em risco, pois dependiam da floresta para viver. Aí começa a história de Chico Mendes e das lutas pela defesa do meio ambiente. Chico Mendes torna-se o ícone brasileiro da defesa do meio ambiente sendo conhecido mundialmente pelos seus feitos.
As senzalas lotadas, dor, sofrimento, angústia, muito trabalho, na maioria das vezes de maneira desumana, todas as formas de maus tratos, fome, sede… todos queriam a liberdade, serem tratados como gente. Esta realidade durou anos, séculos… mas alguns acreditaram, se permitiram lutar contra a escravidão e na figura de Zumbi são reconhecidos como aqueles que combateram e nunca aceitaram a imposição cruel do sistema escravocrata.
Em plena inquisição, órgão da Igreja Católica responsável por apurar e punir atitudes consideradas contra a fé, por volta do século XVI, um padre resolve se rebelar contra aquilo que na percepção dele não estava correto dentro da Igreja. Suas ideias não foram aceitas pelos demais membros do clero da época, mas isto não impediu que Lutero abdicasse da sua situação de sacerdote e iniciasse a história das religiões denominadas à época como protestantes, hoje chamadas de evangélicas.
Na história de alguns países encontramos alguns nomes que merecem destaque, pois se tornaram figuras importantes para a tomada de novos rumos das suas nações. Destaco alguns: Napoleão Bonaparte (França), Oliver Cromwell (Inglaterra), Thomas Jefferson (EUA) e Mitsuhito (Imperador Meiji do Japão). Independente das discussões que podem haver em relação a estes nomes, não há como negar que eles colaboraram decisivamente para a mudança da realidade dos seus países.
Existem biografias que retratam situações muito interessantes, podemos entre várias destacar as das seguintes pessoas: os religiosos Dom Paulo Evaristo Arns, Dom Pedro Casaldáliga, a missionária Dorothy Stang; os filósofo Sócrates, Aristóteles, São Tomás de Aquino; os cientistas Mendel, Leonardo da Vinci, Galileu Galilei, Isaac Newton, Nicolau Copérnico; Malala e sua luta pela educação no Afeganistão; Martin Luther King que lutou em defesa dos direitos sociais para os negros e mulheres, combatendo o preconceito e o racismo. Enfim, há um grande número de pessoas que acreditaram e dedicaram suas vidas em busca de dias melhores. Os nomes citados anteriormente se encaixam perfeitamente neste contexto.
Não podemos esquecer também da contribuição dos pensadores iluministas, que ousaram combater o absolutismo através das suas ideias. Montesquieu, John Locke, Rousseau, Voltaire… criaram e disseminaram novas formas de enxergar a realidade, de mudar o sistema. Foram importantíssimos para a história da humanidade, pois influenciaram o processo de criação de vários países.
Uma personalidade que com certeza deixará seu nome para a eternidade atende pelo nome de Papa Francisco. Independente da crença religiosa é inegável as mudanças que ele está propondo e executando em todo o contexto da Igreja Católica. Muitas de suas atitudes são exemplos de extrema coragem, tanto em relação aos fieis quanto à própria organização interna da Igreja. Seu nome se perpetuará na história.
Os exemplos não vêm só do passado; convido ao leitor para fazer uma pesquisa sobre a pequena cidade de Brejo Santo, situada no interior do Estado do Ceará. Um exemplo atual de que quando se quer, as coisas avançam, de como é possível fazer uma boa gestão das coisas públicas. Mas pesquise e tire suas conclusões.
Percebemos, portanto, que a história da humanidade é cheia de exemplos, de situações que mostram que é possível construir novas páginas de uma nova realidade. Muitos acreditaram e tornaram concretos, através de atitudes, os seus pensamentos. Há esperança… é preciso acreditar!
Walber Gonçalves de Souza é professor.

sábado, 12 de setembro de 2015

PARTIDOS DA FLORESTA: 
UMA METÁFORA POLÍTICA
Crônica publicada no dia 09/09 no Diario de Caratinga.

Houve um tempo em que todos os animais da floresta viviam de uma forma harmoniosa. Cada bicho desempenhava o seu papel. A coruja contemplava a noite, as minhocas preparavam a terra para as plantações, os pássaros eram responsáveis pelo transporte das sementes e alegria do canto nos momentos de festas, o elefante com sua enorme tromba trazia a água, e assim a vida na floresta se fazia. Não havia brigas, disputas, ciúmes, violência e tantos outros males que nós conhecemos e sabemos o quanto dizima nossa sociedade.
Dentro das limitações e características individuais a vida do reino animal era justa e fraterna. Nenhum ser que ali vivia passava fome ou sede. Todos tinham o suficiente para viver. É importante lembrar também, que eles não acumulavam nada, simplesmente viviam a vida!
Até que um dia, certo bicho considerado por todos como o grande líder da floresta, o leão, despertou para uma nova forma de vida. Ele por se achar muito forte e valente não queria mais trabalhar. Queria simplesmente ser servido por todos os outros animais. Mas como sabemos que cada animal tinha a sua obrigação, na falta de um a vida na floresta se modificou, devagar as necessidades foram aparecendo. Muitos animais foram se revoltando, mas por medo aceitavam aquela nova realidade. Outros desapareceram e vários entraram em processo de extinção. Muitos destes por acreditar que ainda era possível resgatar o sonho da vida harmoniosa e justa.
Assim a vida que era bela, passou a ser tenebrosa. A fome e a sede se tornaram duas realidades presentes. As brigas começaram e as disputas também. Todo o clima gostoso e harmonioso havia se acabado.
Depois de muito tempo, e vivendo com grande dificuldade, os animais sobreviventes resolveram criar grupos para defenderem seus desejos. A vida na floresta tornara-se tão difícil que cada espécie começou a olhar os seus interesses, esquecendo por completo o bem coletivo.
Apareceu o Partido dos Roedores, composto pelas capivaras, coelhos e ratos; O Partido Voador, formado pelas araras, papagaios e sabiás; o Partido dos Pássaros Negros, constituído pelos anus e melros; o Partido dos Peludos, mantido pelos cachorros, tigres, gatos e ovelhas… e assim por diante, se não estou enganado naquela floresta se contabilizava cerca de quinze partidos.
Mas não demorou muito, dentro destes partidos começou a haver brigas. Na verdade eles não se entendiam e nem estavam dispostos a olharem o bem comum, queriam sim, tirar proveito próprio. O espírito autossuficiente já havia enraizado suas ações e aspirações.
E em meio a este tumulto nasceu um novo partido, o Partido da Floresta, que no papel tinha uma ideologia bonita, comprometida com a vida dos viventes da mata. O Partido da Floresta pretendia revitalizar a floresta e as relações entre os animais que existiam anteriormente. O triste é que os animais que compunham este novo partido provinham daqueles já existentes e que por motivos de intrigas se afastaram. Por isso, na prática os belos ideais ficaram esquecidos, o cotidiano mostrou que mesmo em um novo partido as atitudes eram semelhantes às de quando eles participavam de outros partidos.
Hoje, a floresta está quase no fim… poucos são aqueles que ousam desafiar este quadro político da bicharada. Os poucos animais comprometidos são perseguidos. Aqueles que se perpetuam no poder, usando de indizíveis formas, vão irradiando injustiças e infelicidades, tudo isso em nome de um falso bem estar e um profundo egoísmo.
* Walber Gonçalves de Souza é professor do Ensino Fundamental, Médio e Universitário na Fundação Educacional de Caratinga/MG.

terça-feira, 1 de setembro de 2015

O FIO DE BIGODE
Crônica publicada hoje (01/09) no Diario de Caratinga.

Em meio à grota, envolto pelo verde da mata e orquestra dos pássaros, situava uma pequena casa com a arquitetura típica das moradias rurais. Armada com troncos robustos manualmente plainados, paredes de barro embranquecidas com cal, janelas e portas de madeira tingidas pelo azul escuro e as telhas cumbuca iniciando seu traçado pela cumeeira encobriam o lar e completavam a imagem daquele cenário.
A família era simples, porém extensa, Sô Manoel e Dona Sebastiana dividiam a casa com sua prole numerosa; eram doze filhos, sendo sete homens e cinco mulheres. Mas na casa, a família nunca estava sozinha, sempre tinha alguém de outros cantos fazendo, mesmo que por uns dias, o seu abrigo.
Depois de mais um dia de lida, Sô Manoel, ao raiar do sol chega em casa cansado, faminto e ao pisar o terreirão, que cercava sua casa, percebe vindo ao seu encontro os seus entes queridos e logo atrás Bili, o cachorro da família, abanando sua cauda. Cena que se tornou comum ao longo dos anos.
Mas naquele dia uma surpresa inesperada estava aguardando o patriarca da família. Dona Sebastiana com aquele olhar de felicidade e espanto anunciou baixinho, meio que ao pé do ouvido a boa nova, que estava gestando mais um filho do casal.
Meio que paralisado, atônito, Sô Manoel sentou-se no banco que estava próximo ao fogão de lenha, olhou para todas as direções, visualizou as panelas, algumas das crianças que ainda o rodeavam, abaixou a cabeça e pela primeira vez deixou transparecer em forma de lágrimas a sua emoção. Levantou-se, caminhou até a janela e olhou para o seu quintal e viu lá no fundo a porteira que delimitava o seu rancho. Chamou Dona Sebastiana que até então estava quieta e ansiosa pela reação do esposo, ao aproximar da janela, sentiu-se tocada e ouviu as primeiras palavras após o seu anúncio, saindo da boca do seu companheiro.
Você está vendo aquela porteira? Daqui alguns meses terei que ter mais força, pois ao passar por ela, mais uma criança estará correndo em direção aos meus braços.
Naquele instante o cansaço e a fome pareciam ter ido embora. A emoção era tão intensa que fazia brotar a sensação indizível do amor conjugal. Parecia que aquela criança seria o primeiro filho do casal.
Criar treze filhos não foi uma tarefa fácil, as horas de trabalho acompanhavam os raios de sol. Mas do fogão a lenha nunca faltou o necessário para que todos crescessem e tivessem força para buscarem seus caminhos.
Não foi fácil também educá-los. Treze filhos representam gerações diferentes, enquanto uns são jovens, adolescentes, outros ainda são crianças. Mas o casal, humilde e firmemente conseguiu conduzir cada um dos seus filhos pelo caminho que eles acreditavam ser o humanamente correto; formando cada um deles com valores e princípios.
Aos poucos, seguindo o ritmo natural da vida, um a um dos seus entes queridos e amados foi saindo de casa. Cada um com o seu jeito e personalidade foi dando cor à sua própria vida. Mas todos, sem exceção, levaram enraizados no seu ser os ensinamentos dos seus pais. Uns se tornaram profissionais liberais, outros funcionários públicos, dois reconhecidos empresários… Mas todos eram reconhecidos como os filhos do Sô Manoel e Dona Sebastiana.
Passadas algumas décadas, em um fim de tarde de verão, sentados no alpendre da sede do rancho, aquele casal com os sinais da idade, vê passando pela antiga porteira um carro. Era um dos seus filhos trazendo com ele a sua família. Os netos ao avistarem os seus avós, saíram correndo e pularam no colo deles. Quase os derrubaram, com tantos beijos… Os dentes escancarados demonstravam a alegria do encontro.
Um dos netos, o mais velho dos três, carinhosamente pediu à vovó que preparasse aquele biscoitinho delicioso que só a vovó sabia fazer. Depois do pedido ela calmamente levantou-se e foi atender ao capricho dos netos, que a seguiram sorridentes.
Restaram os dois na varanda, pai e filho, e quebrando o silêncio o filho disse ao pai: Papai hoje olhando para os meus filhos eu entendo mais do nunca o valor daquele ensinamento simples que o senhor sempre nos ensinou, o valor do “fio de bigode”. O silêncio por um instante voltou, o suficiente para que mais uma vez escorresse pelo rosto do Sô Manoel mais uma lágrima. A lágrima do dever cumprido.
Walber Gonçalves de Souza é professor.