quinta-feira, 26 de maio de 2016

Jornal Hoje em Dia


Gazeta Norte Mineira


Artigo de opinião

AS GRADES NA SELVA DE PEDRAS
Artigo publicado hoje (24/05) nos jornais Diário de Caratinga e Diário de Manhuaçu.



O planeta sofre transformações constantes, algumas delas de forma natural, como afirmou Charles Darwin na sua teoria da evolução das espécies. Já tantas outras são provenientes da ação humana, notadas na forma com que lidamos com os recursos naturais, com o jeito que tratamos o meio ambiente.
Assim, no decorrer dos anos vamos deixando a nossa marca estampada na realidade que nos cerca. Possibilitando portanto uma forma de conhecer o próprio ser humano, pois o seu entorno acaba revelando um pouco de quem ele é. Nesta perspectiva, ao analisar o meio, o contexto em que vivemos, poderemos consequentemente dizer um pouco do que somos. Para exemplificar o que pretendo dizer, vejamos algumas situações corriqueiras que fazem parte do nosso cotidiano.
Digamos que você ao visitar a casa de uma família pela primeira vez, ao chegar lá depara com o seguinte cenário: um quintal com vários cachorros de espécies diferentes, pequinês, vira-lata, pastor alemão, dentre outros; ao entrar na casa, um oratório no cantinho da cozinha e algumas imagens de Nossa Senhora Aparecida espalhadas em lugares de destaque da casa. Outra coisa que chamou a atenção também foi uma camisa do Cruzeiro, com vários autógrafos dos jogadores, emoldurada e afixada no meio da sala em um lugar de destaque. Mesmo que ninguém da família diga nada, ao observamos o ambiente poderemos chegar a algumas conclusões: naquela casa há alguém (ou todos) que gosta de cachorro, é católico e cruzeirense. Senão ela não seria daquele jeito, imagine se teria um quadro da camisa do Cruzeiro na parede da sala, em destaque, em uma casa de atleticanos apaixonados.
Num outro cenário, nas férias de julho, você reúne sua prole e resolve visitar uma família de amigos, que mora distante e que há muito tempo não se vêem. Um município de cerca de 100 mil habitantes. Chegando à cidade de destino, antes de chegarem na casa dos amigos, passam por uma banca de revistas para comprarem um jornal da cidade. Depois da recepção calorosa e de colocarem um pouco da prosa em dia, você pega o jornal e começa a ler as notícias, a capa traz como manchete principal: "Neste ano já são 2.367 casos de homicídio". Pela reportagem, mesmo não morando na cidade, podemos concluir que é uma cidade violenta, que enfrenta, com certeza, sérios problemas de aspectos sociais.
Dito isto, reflitamos um pouco sobre as nossas cidades. Andando pelas ruas, independente se faz parte de bairros ou região mais central, a cada dia que passa a paisagem está ganhando um visual diferente. As nossas casas, aos poucos estão se transformando em uma fortaleza. Há grade para todos os lados. Em alguns casos a cena chega a ser cômica para não dizer trágica. A casa é rodeada por um muro, que por si só deveria ser um limitador, entretanto observamos sobre o muro a existência de uma cerca elétrica e quando olhamos pelos vãos da grade deparamos com as janelas repletas de ferros contorcidos na tentativa de enfeitar a triste realidade, que é a transformação dos nossos lares em pequenas prisões de nós mesmos. Se o ambiente diz o que somos, quais seriam as características de um povo em que suas residências estão repletas de grades?
Ao fazermos uma leitura da paisagem das nossas cidades parece que o pensamento do filósofo Tomas Hobbes é uma realidade. Ele dizia que "o homem é o lobo do próprio homem". E nesta selva de pedra e grades em que as nossas cidades estão se transformando, podemos concluir que estamos fugindo e escondendo da nossa própria espécie. Estamos com medo de nós mesmos. Com medo daquele que como nós partilha do mesmo espaço em que a vida acontece.
Da mesma forma que a febre é uma sinal para o corpo de que há alguma coisa de errado em funcionamento no nosso organismo, as grades são os sintomas de uma sociedade doente. As grades são um dos aspectos que demonstram que o funcionamento da sociedade não está bem. Que algo precisa ser feito e com urgência.
No dia em que você andar pelas ruas e encontrar casas livres de guaritas, cercas e grades, alegre-se pois neste dia estaremos deixando de ser o lobo de nós mesmos.
Walber Gonçalves de Souza é professor.

Gazeta de Muriaé


Gazeta Mineira


A ESTRELA APAGOU
Artigo publicado no Diário de Caratinga, 
Diário de Teófilo Otoni e Diário de Manhuacu - 17/05.



Primeiro de janeiro de 2013 inicia-se para muitos brasileiros o governo da esperança; inicia-se a concretização do sonho de ver a dita esquerda governando o país; acredita-se que haverá dias melhores; que o Brasil será uma nova nação, onde o povo pela primeira vez na história deste país terá vez e voz; que a corrupção será combatida; que a reforma agrária acontecerá de verdade; que os velhos lobos da política brasileira serão combatidos; que as antigas formas de se fazer política ficarão registradas apenas nos anais da história; daquele dia em diante acreditou-se que o Brasil tomaria outro rumo, que os capítulos da nova história seria escrito com outros adjetivos, bem diferentes dos experimentados pelo povo brasileiro até então.
O sonho por dias melhores era tamanho que parecia que tudo iria dar certo. Até mesmo os primeiros meses de governo, marcado por uma dose de arrocho, tornou-se aceito e visto como necessário. Notava-se que aos poucos as coisas foram se alterando, os indicadores socais sofriam modificações positivas, parecia que estávamos no caminho certo, que desta vez tudo seria diferente. Até que enfim havíamos encontrado o caminho do desenvolvimento, nossa nação estava dando sinais que seria um lugar de se viver dignamente, conforme todos sonhamos e desejamos.
Mas algo estranho acontecia debaixo dos nossos olhos, mas como as coisas de certa forma pareciam que estavam caminhando bem, talvez não queríamos acreditar que poderiam ser os primeiros sinais de que havia algo podre por debaixo daqueles ares de bonança.
Mas que fatos são estes? Recordemos alguns: a famosa cena do aperto de mão de Lula com Paulo Maluf; o apoio dado pelo PT ao Renan Calheiros para que ele assumisse a presidência do Senado; a surpreendente coligação do PT com partidos tradicionalmente opostos em nome da manutenção do poder; a relação com famílias tradicionais da nossa política que já demonstraram por inúmeras vezes seus interesses pessoais, entre elas podemos citar a família Sarney (historicamente inimigos); o apoio ao Fernando Collor; o mensalão; o petrolão; sem falar em nomes de vários ministros que ocuparam cargos estratégicos durante estes 13 anos de poder e de pessoas que enriqueceram por vias duvidosas, pois com certeza existem certas profissões no Brasil, inclusive a minha, professor, cito também ajudante de zoológico, profissões que nunca possibilitarão o enriquecimento, ainda mais de uma forma surpreendentemente rápida.
A juntada destes fatos mostra-nos que aos poucos a cúpula petista foi se moldando aos velhos clichês e a tão combatida e tradicional forma de se fazer política no Brasil. Mas é claro com um sotaque aparentemente novo.
Para sermos justos sabemos que durante estes 13 anos um número expressivo de petistas históricos foram levantando suas vozes e alertando que o caminho que estava sendo seguido não estava de acordo com as diretrizes do partido. Muitos começavam a afirmar que o PT estava se tornando mais um, como os demais. Praticamente todos foram tratados com desprezo, como se estivessem errados e o pior como se fossem inimigos dos avanços os quais o povo brasileiro estava conquistando. A maioria abandonou a sigla.
E o resultado de tudo isto? Criamos uma ilusão, um conto de fadas, que se tornou insustentável. Em nome de um populismo barato, destruíram a nação, mantiveram e fortaleceram o que há de mais podre na política brasileira, os velhos lobos e os seus velhos hábitos.
Insistem em dizer que está tudo bem, que não há crise, que é tudo invenção. Não reconhecem os seus limites, seus erros, não reconhecem que fizeram lambança demais, que mataram a esperança. Veja a realidade que nos cerca, de analfabetos, nos transformamos em uma nação de analfabetos funcionais; o Bolsa Família ano após ano só aumenta o número de beneficiados, demonstrando que a pobreza está aí presente; a dívida pública praticamente 70% do PIB. Deram com uma mão e puxaram com a outra!
Não podemos negar que muitas conquistas aconteceram, ocorreram indizíveis avanços em vários setores. Mas em qual governo não houve? Mas da mesma forma que nunca aplaudirei um traficante, por mais que ele faça “bondades” para manter-se com o poder na comunidade, não dá para aplaudir políticos, que de maneira análoga ao traficante, fazem a mesma coisa.
A estrela se apagou! A estrela que um dia mostrou-se como uma estrela guia, cadente e irradiante, transfigurou-se em um estrela nebulosa, envolta em mentiras, promiscuidade, imoralidade, de tudo aquilo que ela sempre condenou.
Walber Gonçalves de Souza é professor.

Gazeta de Muriaé


Gazeta Norte Mineira


Diário da Manhã (Goiânia)


Publicação: Diário de Caratinga (10/05)

O PÉ DE CAFÉ E O CAVALO ARREADO
Há quase dois séculos surgia entre pequenos montes um vilarejozinho. Poucas casas compunham a paisagem daquele lugar.  Via-se córregos com águas cristalinas, uma floresta exuberante, recheada de uma vasta diversidade de plantas e animais. Em especial, para dar um toque de beleza, notava-se uma imensa pedra, sua presença era radiante e do seu alto se conseguia avistar lugares até onde a vista não conseguia mais alcançar.
Aos poucos este lugar foi se transformando, aparecia um arraial aqui outro acolá. Uma casa sendo erguida aqui, outra acolá. Em volta das casas, um curral, uma capela, uma quitanda e tantas outras casinhas, que aos poucos iam dando novas formas àquele lugar.
Gradativamente o verde estava sendo substituído pelo vermelho do chão, o marrom das madeiras cortadas, o branco das casas de barro. A transformação corria num ritmo acelerado e inevitável.
Na toada do desenvolvimento as pessoas iam se aglomerando e aquele que um dia foi um pequeno arraial passa a ser chamado e reconhecido como cidade. O cenário já não é mais o mesmo, a paisagem se mostra com outras cores, cheiros e sabores. O aparente progresso parece tomar conta das pessoas, dos seus sonhos, desejos e vontades. A vida aos poucos começa a tomar outra direção.
Em meio a todas estas transformações uma novidade chega do oeste paulista, novidade esta que mudou o rumo histórico e social daquele que um dia já foi um pequeno arraial. As primeiras mudas de café começam a ser plantadas na região. Passados poucos anos a textura do município se confundia com um enorme tapete verde. Já são milhares de pés de café espalhados por várias partes.
Com o tempo surgem vários produtores, o negócio era plantar café, pois aí estaria o segredo do sucesso. A princípio foi mesmo e várias lavouras podiam ser vistas em todos os lugares. A economia do município passou a girar em torno da atividade cafeeira: fazer muda, plantar e colher o café. Criando um comércio praticamente dependente desta mesma atividade econômica.
Paralelamente ao crescimento deste município tantos outros espalhados na mesma nação também passavam pelo seu processo de mudanças. Uns com outras atividades agrícolas, outros com atividades industriais e tantos outros com prestações de serviço. Cada cidade desenvolvia-se com suas potencialidades e características.
Mas em meio a toda esta situação algo inusitado começou a acontecer. Várias pessoas de outros lugares queriam transferir-se para a cidade do café. Pois ela aparentava ser próspera, economicamente ativa, poderíamos dizer que se encontrava dentro do fluxo do desenvolvimento da época.
Aos poucos foram chegando propostas, entre elas a criação de uma grande indústria de siderurgia; um parque aquático; a fábrica de um famoso refrigerante; universidades e/ou institutos federais. Muitas pessoas de alguma forma enxergavam algum potencial por aqui. Mas todos foram barrados, não tiveram suas ideias bem vistas e bem quistas por aqui. Suas propostas não foram aceitas. E o que todas estas propostas tinham em comum? Gerariam novos postos de emprego, daria um novo ritmo econômico, incentivariam uma nova mentalidade cultural, educacional e social.
E por que elas foram barradas? Talvez a resposta esteja nas mãos de cada um dos “catadores” de café. Pessoas que durante anos e anos, escondidas atrás de cada pé de café, viviam no anonimato, sem rosto, sem vez e sem voz. Com o sucesso das propostas, novos postos de trabalho trariam concorrência pela mão de obra, poderia torná-la mais cara, escassa. E isto não seria interessante para quem, décadas pós décadas, como coronéis, sugam e exploram de forma desumana a força de trabalho.
Nesta cidade, que nasceu de um arraial o “cavalo arreado” passou algumas vezes, talvez ele volte a passar novamente, mas em nenhuma delas conseguimos executar uma decente montaria. Preferimos ininterruptamente ficarmos no entorno de todas as glórias e mazelas do pé de café. Lembrando sempre que as glórias foram para poucos e as mazelas para muitos. Situação que pode ser comprovada pelo retrato social desta cidade.
É claro que a culpa não é do pé de café, mas daqueles que trataram e tratam esta cidade com o cérebro do tamanho de um grão de café. Nesta cidade a ditadura não acabou, os coronéis ainda vivem e reinam!
Walber Gonçalves de Souza é professor.

sexta-feira, 6 de maio de 2016

Diário Popular (Ipatinga)


Gazeta Norte Mineira (Montes Claros)


Gazeta de Muriaé


Artigo Diário de Caratinga

UMA LENDA POLÍTICA
Artigo publicado no Diário de Caratinga e Diário do Manhuacu (03/05).

Em uma pequena cidade do interior das gerais pairava uma maldição que ficou conhecida como a “Maldição do nariz grande”. Conta a lenda que nesta pequena cidade, de quatro em quatro anos, surgiam homens e mulheres, pessoas ditas e reconhecidas por serem distintas, apessoadas, seres de bem, que queriam governar, liderar as pessoas que ali moravam.
Em meio aos debates, discursos, propagandas… Uma dessas pessoas acabava se destacando mais do que as outras e se tornava portanto, o governante, o líder. Aquele que iria, durante quatro anos, promover tudo aquilo que havia anunciado. O início da concretização da esperada esperança!
E o que era prometido? Aquilo que o povo daquela pequena cidade do interior das gerais sempre mais precisa, seria, melhores condições para a promoção da saúde, escolas dignas para proporcionarem uma educação de qualidade, áreas para lazer em família, cuidado com os idosos, projetos urbanísticos, desenvolvimento de práticas culturais, cuidado com meio ambiente… enfim, tudo aquilo que torna um lugar melhor para se viver coletivamente.
Mas estranhamente, sempre uma coisa acontecia, a partir do momento que o escolhido começava a liderar o seu povo, a maldição do nariz grande insistia em atacá-lo.
A cada palavra, a cada gesto, a cada ação… seu nariz vai ganhando um novo formato, vai esticando, ficando mais robusto e pontiagudo.
A princípio as pessoas ficavam sem entender o que estava acontecendo, ficavam pensando e se perguntando, por que crescem os narizes de todas as pessoas que nos governam?! Daí, foi surgindo a crença da maldição do nariz grande.
Até que um dia uma mulher, uma senhora conhecida como Vó Sofia, encontrou a explicação para a tão falada e propagada maldição.
Segundo ela naquela cidadezinha, uma deusa chamada Veritas, que ali vivia por muitos milênios e era conhecida como a deusa da verdade, mas depois de ser expulsa da cidade pelo deus Mens, conhecido como o deus da mentira, jogou uma maldição na cidade, sendo a maldição do nariz grande.
A princípio as pessoas ficaram assustadas com a atitude de Veritas, nunca esperavam dela uma maldição, mas ainda de acordo com Vó Sofia, a maldição lançada pela deusa Veritas não tinha como objetivo prejudicar a cidade, mas sim, permitir que os líderes mentirosos apoiados pelo deus Mens pudessem ser descobertos.
Assim, todos os governantes que tentam enganar o seu povo poderá ser desmascarado, pois ao crescer o nariz a máscara da mentira irá cair.
De acordo com a deusa Veritas, saberemos disto quando as suas ações não condisserem com as suas promessas.
Walber Gonçalves de Souza é professor.

segunda-feira, 2 de maio de 2016